O "CALAE BOCUS". (FINAL)
O Dr Alceu olhava a sua volta, tentando desesperadamente achar uma rota de fuga. Os gigantes que o prendiam postaram-se na soleira da porta na câmara a que fora levado. Mulheres lindas de várias raças adentraram o aposento caminhando tão suavemente que pareciam flutuar. Estavam nuas. Os corpos cobertos com pinturas ritualísticas que ele nunca havia visto antes.
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Uma delas, com uma lâmina dourada que se assemelhava a um cifrão, aproximou-se dele e começou a cortar suas roupas. Uma-a-uma, as peças de roupa foram arrancadas e seu corpo foi massageado por dezenas de mãos habilidosas e untadas com o mais fino óleo. Estranhamente, o Dr. Alceu, relaxou e deixou-se invadir pelas ondas crescentes de prazer. Agora, as mulheres, exploravam seu corpo com suas bocas famintas. Os cabelos compridos caiam-lhes sobre os rostos, escondendo o olhar perdido no transe místico.
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Não suportando mais. o Dr, Alceu, urrava em um orgasmo que nunca experimentara. Abatido pelo cansaço, desmaiou. Não soube por quanto tempo. Mas, ao acordar, estava sozinho na câmara. Vestia uma túnica dourada que refletia a tênue luz dos archotes nas paredes. O homem que o trouxera até ali, estava de pé, observando seu despertar. Apesar de ainda estar amarrado, sentia-se calmo e relaxado. Aquela experiência havia sido magnífica para ele. Em sua vida medíocre, nunca havia sido tão estimulado.
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Com a voz calma e compassada, o homem, passou a explicar ao inerte médico o que ocorreria: “Dr. Alceu, agora o senhor está pronto para o ritual principal. Nele o senhor selará o pacto com nossos deuses e através deles, e da obediência cega, conseguirá riquezas e prazeres nunca sonhados pelo senhor. Tudo o que pedimos é que siga o juramento a risca. As conseqüências de rompe-lo seriam devastadoras para o senhor e sua família”.
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Dizendo isso, fez um sinal quase imperceptível com a cabeça e duas mulheres inclinaram-se sobre o corpo do médico o desamarrando. Ajudaram-no a levantar e apoiando-o nos ombros o conduziram ao átrio principal. Lá chegando, notou que o altar estava limpo e irradiava uma luz estranhamente dourada. Aliás, podia notar que o dourado era a cor predominante do local. Estava em toda parte, nas paredes, no altar, e nas roupas cerimoniais.
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As mulheres o conduziram até o altar e o deitaram carinhosamente sobre ele. Os assistentes reuniram-se ao redor do sumo-sacerdote e começaram a entoar cânticos e evocações. Ao fundo, a chama tornava a se elevar e quase tocar a deslumbrante abóbada. O Dr. Alceu fez menção alevantar-se, o êxtase anterior o abandonara e o medo tomava conta rapidamente de sua alma. Porém, duas mãos fortes como garras de aço seguraram seus braços e o imobilizaram.
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Os cânticos cresciam e tornavam-se mais rítmicos e hipnóticos: “Per Adonai Elohim, Adonai Olavus Maximus, Adonai...”
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O sumo-sacerdote ergueu as mãos e o rosto em direção ao céu. E gritando a plenos pulmões, deixava sua voz sobrepujar todas as outras: “pythónicum, mistérium salamándrae, convéntus sylphórum, antra gnomórum, doemónia Coeli Gad, Almousin, Gibor, Bóllor, Evam, Zariatnatmik - Veni, veni, veni!!!”
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Ao proferir as últimas palavras, um facho de luz dourada o atingiu em cheio no peito. Suas mãos desceram até o altar e apanharam a faca cerimonial. Dominado pelo espírito do Deus, ele desferiu um golpe certeiro arrancando os olhos do Dr. Alceu. Um após o outro. Com a mão livre, puxou a língua do médico e, num rápido movimento a decepou.
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O médico desfaleceu, as dores eram insuportáveis, tentou reerguer-se, mas mãos poderosas ainda o detinham. Sentia mãos macias e gentis sobre sua boca e pálpebras. Eram as sacerdotisas virgens que costuravam-nas com finíssimos fios de ouro puro. Enquanto costuravam, entoavam preces num murmúrio ininteligível.
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Ao terminarem a sutura dos orifícios, elas cobriram seu corpo ensangüentado com moedas de ouro. Nesse exato momento, o Dr. Alceu, notou uma coisa impossível: Ele podia ver.
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Via tudo a sua volta. Apesar de não ter mais olhos, ele podia observar tudo através da aura dos corpos. Sentado sobre o altar, não sentia mais dores. A visão das moedas de ouro trazia uma emanação de tranqüilidade mística. Olhou para suas mãos e podia ver através da pele. Tinha o poder da visão além da realidade. Ainda estava imerso nessa nova perspectiva quando foi trazido de volta de seus pensamentos por uma voz retumbante atrás de si: “Tu realizaste o pacto. A partir deste momento, sua alma pertence aos Deuses Banq-Eir-Oz. Apenas a eles e a nós deves obediência. Agora, receberás a caneta mágica. Com este símbolo de nosso pacto você poderá anular quaisquer decisões, pareceres ou diagnósticos que venham a confrontarem-se com nossos desejos. Este é o símbolo e a fonte do seu poder. romper este pacto é entregar sua vida, alma e família a vingança dos Deuses. Terás poder sobre as mentes humanas para aterrorizá-las e infligir-lhes sofrimento. As artes ocultas serão sua fonte de poder e seu legado”.
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Sentindo-se poderosamente estimulado, o Dr. Alceu, foi conduzido por duas virgens até a entrada do templo. O sol brilhava, e sua luz o fez sentir uma profunda dor. Um carro luxuoso e com janelas negras já o aguardava, conduzido pelas virgens, acomodou-se no banco traseiro e sua visão mística retornou. Ao seu lado, criaturas sem rosto o observavam. Uma dela se comunicou, telepaticamente, com ele dizendo: “Seja bem-vindo, Doutor! Nós agora tomaremos conta do senhor.”
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Sem dizerem mais nada, o conduziram ao posto “conveniado”.
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